Al Qabri Ramos & Sheryl Crow



Corte visceral

Eu sabia que tinha de fazer algo antes que me rebentassem as artérias, os vasos sanguíneos, que sepultasse o "self" num ermo qualquer. Já não chegava tentar me apaziguar na comunhão da natureza, nas vozes do vento que também se erguiam contra mim. Toda eu era medo. Toda eu era cegueira, desesperada que andava atrás de luz. Podemos passar uma vida inteira a falhar. Também podemos, anuo. Podemos tudo, nós que até podemos virar algozes da nossa própria liberdade. Enlouquecer, ocorria-me que enlouquecer ou até morrer devia ser mais fácil do que aquilo que sentia. Não merece a pena a infelicidade "calculada", a rotina infernal das relações acomodadas. Os papéis, os outros, os familiares, o padeiro, a vizinha do lado, as galinhas, os pessegueiros e as mimosas que acenam na paisagem. Inútil paisagem. Que de inutilidade afectiva também se pode amofinar mas não morrer. A não ser daquelas mortes lentas, em que hoje expira o prazo de um orgão e depois de outro, como numa valsa sem fim. O amor quando morre fede, igual a nós, potenciais cadáveres em vias de putrefacção. Morreste-me assim, mataste-nos assim. Num cansaço levado aos limites da compreensão. Três anos? Trinta séculos de mágoa. Hoje todos estes sentimentos me aborrecem. Procurar fora de mim a bússola durante muito tempo cansou-me. Não pode ser nos outros que a encontro. Nem nos frutos e flores que me rodeiam, menos ainda nos ensaios das andorinhas para a migração. Dei um over com todas as bandarilhas erguidas, com todas as bocas que tinha no meu grito mais doloroso, até ficar sem voz. Não é disto que se vive. E cismo que há tanto tempo eu me bastava para rir, para apreciar os outros, as coisas; e num giroflé sem aviso, numa montanha russa de impulsos, rodopiei até ficar em carne viva, toda empolada.
Mais do que enjoada, estou fatigada, mais do que desapontada, estou EXAUSTA.
Agora quero paz. Nem terra e nem céu, nem mar nem rio, só paz. E ela vai chegar!

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